Uma das grandes revelações da pandemia foi sobre a relevância e o impacto da saúde mental na carreira. Em tese, todos sabem que a falta de saúde emocional prejudica e compromete a vida em todas as suas dimensões. No entanto, a maioria das pessoas parece não querer se ocupar com os cuidados relacionados a preservação do próprio bem-estar emocional. Se as pessoas em geral, pouco investem ou investiam na saúde mental, as organizações via de regra, muito menos. Essa realidade tornou-se evidente diante desse vírus que parece ter a missão de escancarar as disfunções da sociedade humana, para quem sabe, termos uma grande oportunidade de corrigirmos algumas rotas.
Por décadas, nós brasileiros, acreditamos no ideal americano de felicidade: pensar positivo, trabalhar muito e produzir cada vez mais para ganhar dinheiro e realizar sonhos. Essa fórmula de sucesso costuma vir acompanhada da ditadura de perfeição, a busca desenfreada por tornar-se progressivamente mais primoroso: mais belo, mais interessante, mais capaz… aperfeiçoando-se em tudo para estar credenciado a conquistar a família, a casa, o trabalho e a vida perfeita. Com isso, construimos uma sociedade em torno de ideais de consumo e status social, que mobilizam pessoas a passarem a vida perseguindo um modelo ilusório de sucesso, buscando “vencer na vida”, o que no fundo significa ter dinheiro e pagar um alto custo emocional.
Ao trilhar esse caminho, nos deparamos com um cenário bem menos glamouroso e hollywoodiano, pelo menos para grande parte da população brasileira.
O Brasil tem ocupado uma das primeiras posições no ranking mundial em ansiedade e depressão. De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), em 2015, eram 11,5 milhões de brasileiros com depressão e 18,6 milhões com transtorno de ansiedade. Dados do ISMA (International Stress Management Association) revelam que 32% dos brasileiros já tiveram um episódio de Burnout.
O fato é que ainda prevalece no mundo do trabalho, a obsessão pelo resultado, a fragmentação do processo e a alienação do ser
Sabemos que as causas são multifatoriais, mas dentre os principais fatores relatados pelos profissionais estão: ambiente com muita pressão, carga-horária extensa de trabalho, acúmulo de funções, execução de várias atividades ao mesmo tempo, dificuldade em “se desligar” do trabalho devido aos recursos tecnológicos e redes sociais.
Em 2020, o home office surgiu como alternativa para se trabalhar em segurança, trazendo alguns benefícios e esperança de menos estresse, mas logo apareceram novos e consideráveis desafios, e após um ano, observa-se entre outras adversidades, a fadiga mental devido ao trabalho prolongado em frente as telas e a restrição do contato social.
O fato é que ainda prevalece no mundo do trabalho, a obsessão pelo resultado, a fragmentação do processo e a alienação do ser.
Dinheiro, sucesso e conquistas materiais podem sim fazer muito bem e potencializar felicidade. O grande equívoco acontece quando em nome desses objetivos, o indivíduo aciona o “piloto automático” e se desconecta de si próprio, alienando-se de seus valores, prioridades e sentido de vida ao adotar um estilo de vida com excesso de foco no trabalho, assumindo uma espécie de identidade de super-herói, anulando sua condição humana de vulnerabilidade. As evidências mostram que ao negar as próprias dores e emoções, o resultado obtido pelo homem é o contrário de felicidade.
Apesar de todas essas adversidades podemos ver luz no fim do túnel. As organizações gradativamente estão se tornando mais conscientes e lançando mão de recursos para zelarem pela saúde mental dos colaboradores. Esses, por sua vez, estão percebendo a importância de reverem crenças e posturas em relação ao trabalho. Existem culpados e inocentes? Quando se trata de saúde mental no trabalho, o indivíduo deve se apropriar da responsabilidade e cuidado por sua saúde emocional, e as empresas assumirem a responsabilidade que lhes cabe e questionarem: “que marcas estamos deixando na vida das pessoas e como estamos influenciando o bem-estar social?”.